sábado, 30 de julho de 2011

Relato de Parto da Aline, nascimento do Gustavo, escrito pela Doula



A Aline me procurou quando estava com apenas 13 semanas de sua segunda gestação dizendo estar buscando incessantemente um parto natural após ter sido submetida à uma cesariana desnecessária há alguns anos sem ao menos ter tido a experiência de entrar em trabalho de parto. A Aline mora em outro município, então, à princípio, a encaminhei para uma doula que atende a região dela. Mas, com o passar do tempo, nos tornamos amigas e decidimos que eu iria acompanhar o parto dela.

Na cidade na qual a Aline reside tem apenas duas maternidades, a maternidade pública cuja os médicos pediram demissão ao mesmo tempo como forma de protesto pelo baixo salário pago pela prefeitura, e a maternidade particular onde as cesarianas eletivas imperam.
A princípio, uma obstetra realizava as consultas pré-natais da Aline e se mostrava bastante aberta à possibilidade de permiti-la ter um parto normal, talvez com uma intervençãozinha aqui e outra ali. Eu achei bem estranho a médica não se importar em ser chamada em uma madrugada em pleno final de semana prolongado, por exemplo, para acompanhar um parto no qual ela ganharia menos do que eu. Mas no fim das contas a médica parou de atender na única maternidade da cidade e a Aline mudou de Obstetra que também dizia que "até faz parto normal".

Em Maio desse ano acompanhei meu primeiro parto domiciliar e fiquei extasiada com a idéia. Contei para a Aline, disse que ela tinha tudo para ter um parto domiciliar, já que mora há poucos minutos da maternidade e o convênio dela não cobria as maternidades de São Paulo para que ela pudesse contratar algum obstetra humanizado daqui. Passei o contato da Ivanilde pra ela e pedi para que eles, pelo menos, sentassem para conversar com ela. Nesse mesmo mês, conheci a Aline pessoalmente e o Diogo também, o marido dela. Ele disse que apoiaria ela na decisão pelo parto domiciliar, até porque, na maternidade da região ele sequer poderia acompanhar o parto de seu primeiro filho! Disseram que tinham condições financeiras de arcar com as despesas de contratação da parteira, então, só faltava resolver uma questão: o medo que a Aline sentia de alguma coisa acontecer com ela ou com o bebê durante o parto. A Aline não era entusiasta do parto natural, ela apenas não queria ser submetida à outra cesariana, pois a experiência anterior tinha sido péssima.

O obstetra da Aline não nos ajudou muito a lidar com a questão do medo que ela sentia, pelo contrário, cada semana que passava, surgir alguma coisinha nova que a Aline precisava amadurecer dentro dela, mais um fantasma a ser exorcizado para que ela pudesse ficar em paz com sua decisão. Nesse ponto, foi muito importante a Aline estar participando da lista de discussão Parto Nosso na internet, onde trocava informações com mães, gestantes, doulas e até obstetras sobre as coisas que o obstetra dela falava com o intuito de apavorá-la. Além de poder contar com ajuda da parteira e da doula.

No início de Julho, o médico realizou uma ultrassonografia e constatou que o bebê não estava ganhando peso e que era pequeno para sua idade gestacional, embora o a ultrassonografia com doppler tivesse apontado que o bebê estava sendo nutrido perfeitamente. Aline ficou preocupada, não sabia se um bebê pequeno poderia nascer em casa. E se ele precisasse ir para a emcubadora? As parteiras, Ivanilde e Luciana, orientaram a Aline e disseram que o parto domiciliar era seguro, sim e que não era para ela se preocupar. Eu disse à ela que o USG costuma ter uma margem de erro e que ela é uma mulher pequena, que o bebê estava crescendo conforme o biotipo dele, que poderia ser como o dela.
O médico do pré-natal constatou também o fato de que o bebê fatalmente "entalaria" no canal de parto e que ele com certeza usaria fórceps para tirá-lo de lá, então, era melhor que ela fosse logo pra cesárea.

O tempo foi passando, todos acompanhando de perto o final da gravidez da Aline, aquela ansiedade comum, o Diogo se questionando se era seguro aguardar mais que 40 semanas. Fui visitá-los novamente, assistimos ao filme Orgasmic Birth juntos, tiramos dúvidas, tomamos café da tarde. Conversamos diariamente através do msn e, enfim, chegou a DDP: 27/07/2011.
Na sexta-feira daquela semana, Aline foi passear com a família e foi também à maternidade monitorar o bem estar do bebê. O médico plantonista fez a gentileza de realizar um exame de toque no qual constatou o fato de que o colo do útero da Aline estava grosso, fechado, sem dilatação alguma e que ela deveria fazer uma cesárea porque havia apenas 99,9% de chance de ela precisar de uma cesárea de todo jeito, porque ela já estava com 40 semanas.

A Aline respondeu que iria pra casa com seu 0,1% de chance aguardar o trabalho de parto.
Por volta das 23:00 do dia 29/07, o Diogo me ligou dizendo que a Aline estava com dor desde às 19:00 daquele dia. Eu pedi para que eles ligassem para a Ivanilde primeiro e então me ligassem. A Ivanilde pediu que a Aline tomasse algo para a dor e tentasse dormir porque ela estava acordada o dia todo e precisaria de energia para o trabalho de parto.

Por volta de uma hora da manhã, a Aline me ligou novamente dizendo que não estava conseguindo dormir, que a dor estava muito forte e que já havia ligado para a Ivanilde ir pra lá com a Luciana. Como eu moro bem longe de lá, avisei que demoraria um pouco para chegar.
A Ivanilde e a Luciana chegaram por volta das 3:00, examinaram a Aline e ela estava com 7cm de dilatação. Colocaram-na no chuveiro e começaram a arrumar as coisas no quarto, local no qual ela passaria o trabalho de parto, para que seu filho mais velho e sua mãe pudessem aguardar na sala.
Cheguei por volta das 3:30 e a Aline ainda estava no chuveiro, reclamando bastante da dor, com contrações bem próximas umas das outras. Sentei ao lado dela e ficamos conversando, a Aline ainda sorria às vezes, disse que a dor do parto era pior do que ela imaginava. O filho mais velho da Aline, Gabriel, ficava tentando animá-la, dizendo que ela tinha suportado a dor até agora e que poderia suportar até o final. O Diogo também estava sempre presente, perguntando se ela estava precisando de algo. O coraçãozinho do Gustavo foi auscultado e ele estava ótimo!
A Aline saiu do chuveiro e pediu para ser examinada. Estava com 9cm já. A bolsa foi rompida para certificar-se de que não havia mecônio, já que, durante a amnioscopia os cabelos do Gustavo impediram a Ivanilde de ver a cor do líquido. O líquido saiu clarinho, estava tudo bem. Os batimentos cardíacos do bebê estavam ótimos também.
Em seguida, foi sentar-se na bola no quarto, com o apoio do Diogo, da Luciana e de sua mãe. Troquei de posição com a mãe dela, apagamos a luz e ficamos um bom tempo conversando, a Aline estava com muito medo ainda, sentindo muita dor, não conseguia se soltar durante as contrações, não importava o que disséssemos à ela. Em um determinado momento a Aline perguntou pra mim se iria morrer. Não tinhamos mais palavras para convencê-la de que estava tudo bem, tudo sob controle. Ela estava na tão esperada partolândia. Queria que tudo acabasse logo, queria não sentir mais dor, coisas bem comuns de se ouvir nessa fase do trabalho de parto.
Já de manhã, a Aline levantou-se da bola e foi caminhar no quarto, ficando de cócoras com ajuda do Diogo nas contrações. Nos sentamos e ficamos apenas observando e tranquilizando-a. Ela não quis comer durante o trabalho de parto, mas tomou bastante suco e se hidratou com água.
Ela pediu para ser examinada por volta das 06:00 e estava, de fato, com dilatação total, só faltava aguardar a descida do bebê.
Daí pra frente, a Aline caminhou, ficando de cócoras nas contrações até que começasse a sentir os puxos involuntários (a vontade de fazer força). Os puxos começaram, ficamos apenas observando enquanto ela escolhia a melhor posição para empurrar, a princípio de joelhos ao lado da cama. Depois de um tempo, sentou-se na banqueta de cócoras, com o Diogo a sustentando. Depois ela ajoelhou-se na cama e abraçou a bola por um tempo, relaxando. Aos poucos, as contrações da Aline foram espaçando bastante, o trabaho de parto foi esfriando a medida em que o bebê descia pelo canal de parto e ela sentia medo dele ficar efetivamente entalado. O trabalho de parto estava sendo longo, intenso e ela estava exausta, deitou-se na cama e tentamos fazer com que ela, pelo menos, cochilasse no intervalo das contrações, mas ela sentia-se desconfortável com o fato de o bebê estar no canal de parto, pois o médico havia dito que havia a possibilidade do bebê entalar e ela só queria que ele saísse para ter certeza de que estava tudo bem com ele. Apagamos a luz, fizemos silêncio e nada da Aline conseguir cochilar para as contrações voltarem. A Ivanilde explicou que era normal no final do trabalho de parto, antes do expulsivo, as contrações diminuirem e que só poderíamos aguardar. Pacientemente aguardamos, a melhor forma de empurrar que a Aline encontrou foi segurando os joelhos, deitada na cama, com apoio do Diogo em suas costas. Mas a Aline estava tão cansada que mal conseguia empurrar ou segurar os joelhos. O bebê estava ótimo, batimentos cardíacos perfeitos, já era possível que nós enxergássemos os cabelinhos do Gustavo!
Preocupadas com a exaustão da Aline e com as contrações durando cerca de vinte segundos apenas e com intervalo muito longo, a Luciana segurou o fundo do útero da Aline e deu leves empurrões para ajudar a descida, enquanto a Ivanilde realizava as manobras necessárias para receber o bebê. Essas manobras foram necessárias para que a Aline não precisasse ser transferida para a maternidade, pois ela fatalmente teria sido encaminhada para uma cesárea naquela situação, como era um parto normal após cesárea, o protocolo nas maternidades é não utilizar hormônios sintéticos para indução e sim partir logo para a cesárea. E não poderíamos aguardar mais tempo para as contrações ficarem mais eficazes pois a Aline estava exausta e só queria ter seu bebê nos braços.
O Gustavo nasceu ótimo, lindo, forte e gordo, às 09:25h! Nasceu com 3.400kg, não era pequeno coisa nenhuma!
Foi uma experiência emocionante para o casal e muito bonito ver a família toda participando, coisa que não aconteceria na maternidade de forma alguma!
A Luciana ajudou o Gustavo a pegar o peito e mamar, ele ficou um tempo também no colo do pai, enquanto a Ivanilde dava alguns pontos na Aline.
Esse parto foi muito especial pra mim pois tenho um carinho enorme pela Aline que foi super guerreira e corajosa, enfrentou seus medos, bancou o parto domiciliar e PARIU apesar do bebê supostamente pequeno, apesar do médico dizer que ele iria entalar, apesar do plantonista dizer que ela só tinha 0,1% de chance de entrar em trabalho de parto, apesar de ser muito ansiosa, apesar de ter sentido medo da dor, apesar de ter pedido para desistir, etc, etc, etc...

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