quarta-feira, 22 de maio de 2013

O grande medo não é da morte é do protagonismo - Por: Kalu Brum

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Se existe um medo genuíno é o medo da morte. E se existe um fato que assusta, incomoda, chama atenção, arranca lágrimas, faz com que a gente queira correr logo para casa para abraçar nossos filhos é pensar na morte de uma criança.
Seja com poucas semanas, seja durante o parto ou com poucos anos de vida, uma criança morrer rompe com a ordem natural dos fatos.
A dor é tamanha que nem existe nome para pais que perdem seus filhos. Estar diante da morte nos leva a fazer muitas perguntas: o que poderia ter sido diferente? O que fulana poderia ter feito para mudar o desfecho da tragédia?
Ontem a novela da Globo, Amor à Vida, mostrou dois partos complicados e a morte de um bebê e sua mãe, devido a uma sucessão de erros obstétricos, se tratássemos da vida real.
Como disse o Obstetra Marcos Nakamura:
1) Mulher com pré-eclampsia ou mesmo eclampsia e síndrome HELLP pode ter parto normal. Mulheres de alto risco são as que mais se beneficiam do parto vaginal. Não havendo sofrimento fetal ou outras contraindicações, o parto normal é o mais recomendado.
2) A gente faz aquele sulfato de magnésio. Foi o único acerto da novela.
3) Nenhuma mulher morre de parada cardíaca súbita com pressão elevada. As mortes decorrentes da hipertensão na gravidez decorrem de sequelas da eclampsia e conseqüências da síndrome HELLP (rotura hepática, coagulação intravascular disseminada). No primeiro caso é preciso ter convulsão e, no segundo, as conseqüências da síndrome HELLP levariam à hemorragia com choque hipovolêmico. A unica complicação associada à pré-eclampsia que poderia matar repentinamente seria o edema agudo de pulmão, mas como essa complicação foi feita pra qualquer idiota tratar (morfina, diurético, elevação de cabeceira, O2 etc.) ninguém morre disso dentro de um hospital. E a mulher não teve dispneia, o que também descarta embolia pulmonar.
4) Existe cesárea pra mulher morta. Mas o intuito da cesárea não é só tirar o bebê vivo, mas também facilitar as manobras de ressuscitação. Se uma mulher está no expulsivo e tem uma parada cardíaca, a primeira coisa que me passaria na cabeça, além de pedir a alguém que inicia-se manobras de ressuscitação, seria pedir um forceps para tirar aquele bebê. Se não der, seguir a regra dos 4 minutos, cesárea caso não haja reanimação dentro desse tempo.
A Rede Globo mostrou uma cena que permeia o imaginário coletivo: de que o parto normal pode matar.
Em nossa sociedade há sempre a culpa do Parto Normal causar sequelas, paralisias ou mortes. Nunca (ou quase nunca) se fala das mortes, das complicações decorrentes das cesáreas eletivas.
Quando um bebê vem a falecer em um Parto Normal há sempre a sensação de que houve falta de assistência. Quando algo acontece em decorrência de uma cirurgia há a resignação de que “tudo foi feito para salva-los”.
Quando um bebê morre e a mulher optou por uma parto domiciliar fica o estigma de que houve máxima negligência.
O que mata, de verdade, é a falta e o excesso (uso indiscriminado) da tecnologia.
O Brasil tem quase 52% de cesarianas e amarga a posição de 78 país no ranking de melhores lugares para ser mãe , porque a mortalidade materna e neonatal não caem. Mesmo que quase 97% das brasileiras já façam 3 consultas de pre-natal durante a gestação, mulheres e crianças estão morrendo em decorrência das cirurgias desnecessárias.
Bebês morrem, isso é fato. E é cientificamente comprovado que se morre muito mais (3,5 vezes) em decorrência de uma cirurgia cesárea.
Mas ao morrer em decorrência do uso da tecnologia é válido. Morrer por falhas biológicas é negligência. Morrer em casa é assumir integralmente o protagonismo das escolhas.
Pensa comigo: há uma chance mínima de se morrer( ou colocar a vida de uma criança em risco) em um parto natural. As chances são maiores quando a assistência é falha, com uso indiscriminado de ocitocina, anestesias, que aumentam os riscos de contraturas uterinas não fisiológicas ou choques devido a presença das drogas no organismo.
Em uma cesárea os riscos são 3,5 maiores! Ou seja: elevo as minhas chances de óbito. Mas como se vale mão da falsa sensações de controle mediado pela tecnologia, controle do tempo, da hora, dos profissionais, uma escolha mais arriscada parece certa.
Como mostra neste artigo da Dra Melania Amorim (os riscos e resultados de mortes são praticamente idênticos em hospitais ou em casa.
Há uma ilusão de que no hospital há segurança. Como a criança que acredita que os pais podem defende-la de qualquer mal do mundo.
Em um hospital, muitas vezes, há menos monitoramento e observações integrais do ser humano ( em seus aspectos fisicos, emocionais e espirituais) do que em um parto domiciliar em que a assistência é contínua e abrange diversos aspectos que envolve um nascimento.
Se hoje há um Deus a que muitos se curvam é da tecnologia: aquela que indica sofrimento fetal (com uma grande margem de falsos positivos), que determina o peso e idade gestacional do bebê (com margem absurda de erro) que leva bebês a termo a óbito com seus pulmões mal formados. Morrer por causa da tecnologia é válido. Morrer quando se assume um protagonismo é combatido.
Mesmo sabendo que novelas são fições, sabemos que elas refletem e endossam o imaginário coletivo. Morrer dramaticamante sem ter sido salvo pela tecnologia é um forte temor coletivo.
A Globo poderia ter ousado e mostrado uma morte em decorrência de uma cesárea. o Drama seria mais real e próximo do realmente acontece no mundo. Morrer de Parto Normal já está demodê.

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